Mãe, pai e os três meninos vestidos com roupas da mesma tonalidade. Todos a postos na sala de jantar, aguardando os indícios da meia-noite, pra dar início à tradição de celebrar as primaveras do mais velho ao primeiro minuto do novo dia.Na casa ao lado, um casal de senhoras de idade anseia pelo resultado da […]
Autor: Gabriella Casa Nova
interiorana metida a escritora; enroladora de palavras, pesquisadora curiosa dos assuntos da existência, acumuladora de funções e memórias.
“Travessia” ou: monólogo a beira rio
INT. QUARTO EM CASA À BEIRA DO RIO – NOITE O quarto é pequeno e modesto. A luz é baixa, criando sombras dramáticas nas paredes. O som suave da água do rio pode ser ouvido ao fundo. O ambiente parece apertado, abafado. Há algo melancólico no ar. Duas PESSOAS se observam cautelosamente. – Antes de […]
Eu teria escrito um livro pra você se tivesse mais tempo. Ou um soneto que você teria odiado; e, curiosamente, eu também. Quando dei por mim, tu já tinha partido em bando com os primeiros pássaros da manhã. O telefone tocou meio diferente e, antes que eu pudesse compreender, o mundo se/me precipitou de corpo […]
Antes de tudo era ela
Antes de tudo era ela. Um cheiro de vinho rosé entranhado na pele, pescoço vivo, latejando; ela toda um pêssego, de unhas afiadas e olhos cor de céu, mas um céu em dia de prenúncio de tempestade. Seu sulco derramava a mais fina vida, escorria dos olhos até o ventre com a fluidez de um […]
Domingo de sol. Sento-me no centro das memórias e estendo a toalha de motivos alegres à espera da funesta hora. Sirvo um banquete de ossos já roídos até o talo, disponho uma coleção de estilhaços como fossem taças de cristal. Um festim de falhas e dores que imploram pela iminente colisão que, enfim, findará toda […]
“Eu sempre deixo um pedaço de mim…
… embora eu siga adiante” Feche os olhos. Você retorna à antiga casa. Há canários e cartomantes pelo quintal. Precisa reconhecer suas faces e suas vestes, mesmo que tudo tenha sido levado: foi uma grande enxurrada. Você retorna à antiga casa, ao seu terreiro, suas entidades, ainda que nada mais seja como antes – pra […]
O tempo voa. Pela manhã gritei com R na cozinha antes de tomar o táxi para o trabalho. Moça criada por pai gritante e mãe calada que sou, presenteei-me com o auge de uma arrogância no café da manhã. Chamei de reparação. Enquanto aguardava na calçada, o céu como um toldo todo azul resplandecente, resolvi […]
in media res

é meio da madrugada e algo me desperta numa fúria melancólica. talvez uma imagem, um delírio, um espasmo… me desperta e não há tempo de me ater ao concreto — preciso f l u i r. fito o relógio deixando cada segundo ir embora num exercício involuntário de fruição do tempo. cada momento vale meu […]

Estão em silêncio no apartamento os dois, inertes, em esquemas quase teatrais. Uma paz que arrebenta descreve círculos por todo o ambiente enquanto o homem fuma na cadeira perto da porta e a mulher encara a janela, não se sabe se estarrecida ou apenas em profunda contemplação. Nem uma música, um suspiro, o chiado de […]
Pragmática do silêncio

A mais nova e a mais velha, sentadas à soleira da porta, em seus melhores trajes de domingo, aguardam, ansiosas, a chegada do pai. É dia de fazer compras e ir ao cinema, cujas poltronas tem pulgas, mas elas também saltitam pela casa sem grandes pudores então tudo bem. Anseiam, as meninas, pelo melhor dia […]