Fui convidado para um evento de uma pessoa de quem gosto muito. Precisando voltar à minha rotina de trabalho para poder responder sobre minha presença, a mensagem ficou sem resposta por algumas horas. Percebendo que eu poderia (e queria) comparecer ao evento marcado, mandei minha resposta:
“Garrado!”
Essa mensagem teria passado despercebida em círculos sociais que eu costumava navegar, quando ainda residia na minha cidade natal. Significa que eu estou “agarrado” com o rolê e não vou soltar, ou seja, eu vou com certeza. Em prol da clareza da minha mensagem, fui obrigado a usar um emoji de joinha e mandar a mensagem mais de velho que já saiu do meu teclado:
“Garrado!!! (y)”
Perguntei-me se talvez a expressão em si já não fosse uma expressão datada, tendo em vista que eu a utilizava em Belo Horizonte, circa 2014. Questionei-me sobre a necessidade de me apegar a expressões que talvez parecessem forçadas e escrever todo um livro se passando naquela cidade, viajei no meu sotaque flutuante que é de todo lugar e de lugar nenhum, sobre como eu não consigo me conectar com as experiências das pessoas daqui nem de lá.
Não é como se eu tivesse sido expatriado e nunca mais pudesse ver a minha terra natal, e por isso vivesse com saudade dela. Eu só cresci assim: meio lá, meio aqui; e acabei assado: nem de lá, nem daqui. Com as gentes dos dois lugares achando minhas expressões estranhas, meu sotaque esquisito, um empurra-daqui-empurra-de-lá…
A onde pertencem as pessoas meio-a-meio? Aquelas que chamam lanche de sanduíche como típicas paulistas, mas se recusam a deixar de chamar o copo de Lagoinha? Por quanto tempo Belo Horizonte será meu lar, se continuo sem conseguir botar meus pés na orla da Lagoa ou ver a cidade do alto da Praça do Papa? Será que um dia os meus gerúndios serão fanhos demais pra que eu possa dizer que eu ainda não sou daqui?
Não sei porque meu coração escolheu aquela cidade, mas escolheu. Mesmo sem poder voltar, dia sim e dia também me dá vontade de me reconectar com minhas raízes, mesmo sabendo que há muitas ervas daninhas as cercando. Não é tão longe, mas muitas coisas me mantém distante de lá, pelo menos fisicamente. Emocionalmente, contudo, serei sempre um belo-horizontino, garrado com minha saudade das raízes.

Sou um escritor: cronista, poeta, contista e ocasional verborragiador, além de gestor de projetos sociais. Escrevo sobre a minha vivência enquanto pessoa trans não-binária e não monogâmica, sobre meus excessos e faltas, abundâncias e escassezes.
Uma resposta em “Garrado”
Pouco poderei comentar aqui a não ser que nossas palavras expressam o que a gente é. Nossas origens, nossas raízes, nossa vida.
Por mais que a gente mude de cidade, um pouco do nosso rincão (como falamos aqui no Rio Grande do Sul) está com a gente.
É aquela coisa. Você sai da cidade, mas a cidade não sai de você.
É isso. Um grande trabalho e até a próxima.