Categorias
crônica

O mês etéreo

A gente pisca, é dezembro.

Essa é a sensação, mas os sinais já estavam lá. Guirlandas, bengalas listradas, bolinhas vermelhas, pinheiros, renas (renas?), luzes coloridas. Os enfeites de Natal começam a tomar as lojas desde o final de outubro, sorrateiramente, e nós, assoberbados de tarefas, compromissos e atividades, só vamos nos dar conta mesmo em dezembro. Mas já?

É o mês do fim das aulas, das últimas provas, recuperação da escola. Filhos e filhas contando os pontos para ver se passaram. “Tem aquele trabalho ainda, mãe, são mais cinco pontos. Vai dar. Confia”. Época de renovação de matrículas. No colégio, você chora a manutenção da bolsa. No curso de inglês, implora pelo desconto de 15%. Na academia, renova o pacote anual, aquele com descontão. Acho que os gastos vão caber em 2025.

Dia da festa da firma. Sem expediente, bebida e comida liberadas. Som na caixa. O chefe afrouxa a gravata, a secretária solta o coque e a assistente de serviços gerais cai no samba. Não necessariamente nessa ordem. O clima de descontração te reconecta com aquele ambiente do qual tanto reclamou durante o ano. São todos tão divertidos que você decide que vai estreitar amizades. “Ano que vem vai ter festinha lá em casa, hein galera!”, você faz a promessa.

Depois vêm os pequenos encontros de grupos restritos ou de subgrupos. Tem aquele só com o pessoal mais próximo do trabalho em que vocês riem da performance a la John Travolta do chefe e se dão conta de que também podem ter extrapolado. “Caramba, prometi festa lá em casa”. Tem o grupo de amigas, você e mais duas ou três, o grupo da faculdade, o da infância, o de pais dos amigos dos filhos, e assim por diante. Quando você se dá conta não vai dar tempo de fazer todos os subencontros.

Vinte e um de dezembro, solstício de verão, o dia em que a incidência solar atinge o seu ápice aqui no hemisfério sul. Calor dos infernos, todo mundo derretendo e você percebe que não fez nenhuma compra de Natal ainda. Corre para os shoppings da vida, lotados, se revolta com o tanto de neve representada nas vitrines (onde esse povo acha que está? Já viram o calor que está lá fora?), e debocha da rena (onde já se viu esse animal sobreviver por aqui?).

Você se insere na dinâmica insana de compra de presentes como se tivesse dinheiro para pagar por tudo aquilo. Qualquer lembrancinha, cem reais. Como faz? Aperta daqui, aperta de lá. Compra um par de meias para um, para conseguir comprar uma blusinha para outro, e segue o barco. Quando vê, empurrou um monte de dívida para janeiro, com reflexos ainda em fevereiro. Será que vou conseguir pagar a academia mesmo?

Então é Natal, todo mundo arrumadinho na sala para confraternizar, agora em família. Assuntos em dia, o tio do pavê, a tia que errou a receita do bacalhau (pela milésima vez) e o primo contando as aventuras fantasiosas que realizou durante o ano (no mundo real ou no mundo das ideias). Presentes na árvore, peru na mesa, renas enfeitando a sala (renas?). Até que a ceia é servida, os presentes trocados, e todos voltam para casa supostamente satisfeitos.

Na minisemana que se segue, programas de TV com retrospectivas do ano, calor dos infernos, preparação para a ceia de ano novo, encontros que não couberam antes do Natal, troca de presentes nas lojas, dia trinta e um, fogos, espumante. Feliz ano novo! Feliz 2025!

É, a gente pisca, dezembro acabou.

6 respostas em “O mês etéreo”

Carina, muito gostoso ler tua crônica. Me fez pensar que no fundo, eu gosto mesmo que a gente pisque e que dezembro acabe. É muita expectativa para um mês só. Um feliz 2025 pra você 🙂

É a correria nossa de cada dia, Carina, que não deixa ver o quão rápido o tempo passa.

Aqui no Rio Grande do Sul esse mês ainda foi marcado por uma ou outra tormenta. As águas de 2024 foram pra arrebentar.

Mas é isso. De boleto em boleto, de compra em compra, de reunião de família a reunião de família e de festa de fim de ano da firma a festa de fim de ano da firma a humanidade caminha.

Esse é o destino de grande parte dos seres humanos.

É isso, Carina. Um grande abraço, até a próxima e um Feliz Natal.

Pois é, Mário. Tudo passa muito depressa. É preciso estar atento para aproveitar os momentos. Triste o Rio Grande do Sul estar enfrentando novamente tanta dificuldade. Desejo um 2025 mais tranquilo por aí e para todos nós. Obrigada pela leitura e pelo comentário. Abs, Carina

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *