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Meio copo vazio

Não há quem não conheça a metáfora do meio copo cheio ou meio copo vazio. Ela se tornou uma maneira popular de se referir à forma otimista ou pessimista de encarar a vida.

Em nosso círculo familiar e de amizades é fácil perceber quem são os que tendem a ver o copo meio cheio, e aqueles que, na maioria dos casos, fazem questão de mostrar o lado vazio. Algumas pessoas requintam nesse quesito copo vazio, como é o caso de uma amiga de infância.

Comecei a perceber seu traço de pessimismo ainda quando éramos pequenas, e isso a acompanhou durante a adolescência e pela vida adulta. O pior é que não se contentava em ter prognósticos negativos somente em relação às suas expectativas. Entre as amigas, era o que se chama de desmancha prazer — sempre pronta a acabar com a alegria ou a confiança de quem quer que fosse.

 Quando crianças, se a brincadeira era de subir em árvore, ela se postava em frente e avisava: “Cuidado, isso não vai dar certo, vamos cair”. Se toda a turma queria brincar de esconde-esconde no escuro, com os olhos esbugalhados ela punha terror: “Isso é perigoso, alguém pode se perder”.

O tempo foi passando, e quando chegamos à adolescência os vaticínios passaram a ter contornos que beiravam ao bullying. Ao nos prepararmos para uma festinha (e era um tempo de festa de dança, em que os meninos tiravam as meninas para dançar), ela nos envolvia em um abraço com o olhar caído e sussurrava: “Olha, não fique triste se ninguém tirar você para dançar, tá? Eu, que já era tímida, ficava balançada, perdia o rebolado.

E quando fizemos vestibular então?  Chamava de lado, fazia uma careta e soltava: “Quantos candidatos para cada vaga, cem? Humm então esquece, quase impossível você passar”. Não dava nem vontade de ver a lista dos aprovados, que era publicada no jornal.

Ela não fazia isso de maldade, não. Era derrotista também em relação a si mesma, tinha um tremendo medo de se entusiasmar com alguma coisa e depois se decepcionar.

Seu pessimismo foi ficando cada vez mais forte no decorrer da vida. A partir de um determinado momento, começou a derivar para outro tipo de comentários que, na minha maneira de ver, já pendiam para o lado da bruxaria.

Se compartilhávamos planos de viagem para a praia, dizia que era melhor não se entusiasmar porque, pela previsão, tinha chance de chover. Se nos animávamos para assistir a um filme que entrou em cartaz, tinha ouvido notícias de que o final era triste. E até se sentíamos desejo de comer uma fatia de bolo, era melhor não comer para não engordar.

E para todos os seus maus agouros, fechava com essa frase: “Ouçam o que eu digo: Melhor não rir na sexta para não chorar no sábado!”

Agora, se você se identificou com essa minha amiga, cuidado! Um estudo realizado com cerca de 80 mil pessoas por mais de 10 anos, publicado no Proceedings of the National Academy of Sciences, concluiu que homens e mulheres mais otimistas vivem 11 a 15% mais do que aqueles mais pessimistas.

2 respostas em “Meio copo vazio”

Senti primeiro uma certa raiva dessa sua amiga de infância, depois pena…Quanta infelicidade acumulada e pior, quanta vida não vivida. Bacana você escrever sobre o assunto, Ana!

Otimismo e pessimismo. Uma linha tênue separa estas duas palavras em relação as pessoas.

Talvez o problema com sua amiga seja o medo de falhar em tudo na vida. E esse tipo de pessimismo esconde na verdade, a vontade de querer ser feliz e não conseguir por algum motivo desconhecido.

A famosa nuvenzinha na cabeça com chuvas e trovoadas o tempo inteiro.

Acredito que o alto astral é a melhor forma de combater isso, mas tudo depende de inúmeros fatores.

É isso. Vamos tentar não cair nas garras do pessimismo, porque pode ser fatal pra gente.

Um grande abraço e até a próxima.

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